Por Osvaldo Costa Martins*

 

A Modernidade é um projeto civilizatório que, entre êxitos e fracassos, permitiu a experiência inédita da instituição de diversos Estados Nacionais sob regimes democráticos e formas republicanas de governo. Implicada nisso estava também a possibilidade de seus negativos: os regimes totalitários e os golpes de Estado. Desde sua fundação, a República Brasileira padeceu de inúmeros destes. O penúltimo foi deflagrado em 31 de março de 1964 e conseguiu pôr em vigência um regime ditatorial a partir do dia seguinte, precisamente o dia dedicado à mentira.

Muito se pode extrair dessas marcas gravadas com violência no texto-brasil. Destaco aqui uma evidência que se decanta desse histórico de golpes à democracia brasileira: nenhuma conquista social está permanentemente assegurada. Para mantê-las, sempre serão necessários constantes esforços coletivos e institucionais que se renovem a cada geração.  Quem poderia imaginar com antecedência que, após 27 anos de relativa estabilidade democrática, o Brasil fosse assistir à retirada do poder de uma presidenta da república, legitimamente eleita, sem que ela tivesse cometido sequer um crime de responsabilidade? E mais, alguém poderia supor que, dois anos depois, seria eleito para a presidência da república um político que, por toda sua carreira, anunciava apreço por ditadores e torturadores e admitia, desde a campanha eleitoral, o fechamento do Supremo Tribunal Federal? A impermanência lançou suas sombras sobre as instituições democráticas do Brasil uma vez mais. E muitas gerações, para as quais a ditadura não passava de uma palavra vaga, passaram a sentir cotidianamente a densidade iniludível das ideologias totalitárias que assumiram o comando do Estado Brasileiro.

As datas nacionais são importante recurso de rememoração de acontecimentos que precisam ser simbolizados e ritualizados para que não se realizem novamente, seja como farsa seja como tragédia. O dia 31 de março deve ser lembrado não como data comemorativa ou festiva, mas como aquela em que as Forças Militares mentiram ao povo, rasgaram a Constituição e deram início ao período mais nefasto da República Brasileira. A cada 31 de março, para as gerações presentes e as futuras, será necessário visitar a nossa história e dizer renovadamente e sempre: ditadura nunca mais!

*Osvaldo Costa Martins é psicanalista e membro do Fórum Fortaleza e da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano.